Entrevista
20.10.2017
Redes sociais: riscos e oportunidades para os movimentos e organizações sociais

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Por Elka Macedo e Verônica Pragana | Asacom

Quais os riscos que rondam os usuários das redes sociais e internet? As organizações e movimentos sociais têm consciência da vulnerabilidade da troca de informações por email, no Facebook e no Whatsapp, que são os canais mais populares no Brasil? Qual a lógica por trás de cada rede social?
Quanto mais rápida e prática a comunicação acontece através dos aplicativos utilizados nos celulares, mais imprescindível se torna usar o velho esquema de planejar as ações e estratégias para chegar nos diversos públicos.
Todas estas questões foram comentadas por Iohann Arispe, engenheiro em computação e colaborador do MST na área, na sua palestra sobre segurança da informação no Encontro de Comunicadores e Comunicadoras Populares do Nordeste, realizado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no final de setembro, em Caruaru (PE).
Na Semana Nacional de Luta pela Democratização da Comunicação, compartilhamos a entrevista concedia por Iohann à Asacom.

Asacom - Quais são os desafios de se trabalhar com as redes sociais e a internet hoje?
Iohann Arispe - A pergunta é grande porque abrange muitos aspectos da tecnologia. Pensar na segurança e nas vulnerabilidades que uma tecnologia traz é um primeiro passo. Ser um pouco mais consciente sobre a realidade. Um exemplo é o que aconteceu em 2013, quando foi revelado que o governo dos Estados Unidos e organizações locais estavam espionando as pessoas do mundo inteiro. O que significa isso para nós? É uma prova de que a tecnologia foi criada para vários fins, de uso público e uso social, mas ao mesmo tempo, essa mesma tecnologia tem um fim de controle, tipo uma espionagem, de uso contra os usuários.
A internet é uma rede de comunicação global. É uma rede de redes conectando várias pessoas. Mas, fisicamente, funciona ligando computadores em diferentes lugares do mundo. Por trás dos computadores, tem pessoas. E por trás destas pessoas tem organização ou grupo. Então, a internet não é completamente livre, não é completamente anônima, porque a informação tem que passar por diferentes canais no mundo. E quem controla esse canal, vai ter acesso a essa informação.
Então, estamos vulneráveis usando a internet. E um dos primeiros passos neste campo da comunicação é entender que tudo o que estamos conectando pela internet é como se você estivesse com autofalante e as pessoas que estão interessadas em ouvir vão pegar aquela informação sua.
Entender a tecnologia como uma estrutura vulnerável é o primeiro momento pra gente entender que precisamos aprender mais sobre tecnologia. Não é só para os especialistas. É para todo mundo.

Asacom - Existe uma grande apropriação das redes sociais pelo campo popular. A que precisamos nos atentar?
Iohann Arispe - As pessoas não usam mais torpedo, email, usam o Whatsapp, uma mensagem de áudio viaja muito rápido e chega a muitos grupos. Uma ferramenta muito boa. Os movimentos populares se apropriaram de uma ferramenta que foi criada para fins mais comerciais, mas também existe uma vulnerabilidade que é o desconhecimento de como esta ferramenta está sendo configurada por trás. Estamos um pouco reféns porque não sabemos como a tecnologia funciona.
Esse canal de comunicação que viaja de celular para o celular do destinatário é um caminho que a gente não controla. O Whatsapp diz que foi implementado uma criptação de ponta a ponta, mas não temos como auditar que o que eles falam está acontecendo. Do mesmo jeito, acontece com todas as tecnologias de comunicação.
Mas um primeiro passo para os movimentos sociais é entrar no debate de que tecnologia usar, saber como essa tecnologia está configurada e definir o uso desta tecnologia. Se eu estou organizando um ato público na rua e tem informação confidencial, não precisa passar pelo telefone, whatsapp, email, precisa usar de comunicação menos tecnológica pra algo mais simples.

Asacom - A princípio quando escutamos você falar sobre essa vulnerabilidade, pensamos “nossa, não quero mais usar as redes sociais”. Mas não é isso que você está trazendo, mas o cuidado que devemos ter...
Iohann Arispe -Um caminho é aprender a usar todas as redes sociais que apareçam porque elas têm uma característica temporária e de moda. É bom entender porque acontece isso e é bom saber como podemos ocupar estes espaços.
Se você lembra o início do Facebook, servia para mandar fotos entre amigos e mensagens, depois foi aparecendo o uso das páginas, jornais entraram e tinham muitos grupos e blogs compartilhando a ponto que o Facebook está saturado de informação, mas é um meio que você entra e funciona como um catálogo de informação. Se você acompanha 50 revistas no mundo, vão aparecer informações destas 50 revistas.
É interessante saber como ocupar estes espaços porque publicar no Facebook não significa que teremos uma audiência global. O Facebook tem um limite de alcance que ele coloca para cada publicação. Embora seu público seja de um milhão de pessoas, o Facebook vai segmentar este público para que só atinja 30% dele e você precisa pagar para atingir o restante. E aí é o negócio do Facebook. Não é uma rede que está aberta e é democrática 100%.
Tem outras redes sociais que também tem limitações, mas muitas vantagens. Por exemplo, o Instagram está começando a ocupar muito mais o espaço porque tem um conceito muito mais simples, é uma foto, uma mensagem curta e é transmitida de uma forma muito rápida. Todo mundo hoje tem um celular, uma câmera, então, pode criar conteúdo de uma forma muito rápida. Se vocês acompanham jornais e meios de comunicação de todo mundo sabem que estão todos no Instagram. Tem uma forma de publicar notícias e de levar [o público] para o conteúdo que se quer.
Não existe uma rede social global e única. Agora o Facebook quer ser um monopólio. No Brasil, o maior uso de redes sociais ainda é o Facebook, mas é um grupo ainda limitado. Se entendermos os públicos, vai nos ajudar a definir que canais, meios e formas vamos criar para chegar nas pessoas. Se queremos atingir um grupo de camponeses no interior de Pernambuco, não vamos fazer isso só com o Facebook, porque tem um grupo grande de campesinos que não são usuárias deste meio. Pensar em como chegar nestas pessoas é mais interessante do que focar tudo no Facebook.
Então, uma recomendação para as redes sociais é começar a ver as limitações e entendê-las. Depois, definir o público-alvo e começar a diferenciar o conteúdo. Quando os blogs começaram a aparecer, outros tipos títulos começaram a chamar atenção do público de forma diferente. Entenderam que um texto muito curto e uma imagem simples, que as pessoas veem de forma rápida na tela, precisavam chamar atenção para que se acesse o conteúdo.
Não vale a pena sair das redes sociais por completo, mas saber quando usá-las e criar conteúdo dedicado para isso.