Semiárido
08.06.2016 SE
Assistência Técnica e Extensão Rural - Assessoria que potencializa conhecimentos e economia familiar

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Por Laudenice Oliveira - Núcleo de Comunicação do centro Sabiá

Durante oficina, participantes refletem sobre a Ater como estratégia para fortalecer e ampliar a produção da agricultura familiar agroecológica | Foto: Ana Lira

Trabalhar a assessoria técnica a partir do olhar do conjunto de inovações aplicadas pelas famílias, articuladas com as políticas públicas e os conhecimentos adquiridos nos processos organizativos. Esta a preocupação das organizações que trabalham com a Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) nas redes e articulações que têm como proposta potencializar a agricultura familiar de base agroecológica. No terceiro dia do IV Encontro de Agricultores e Agricultoras Experimentadores/as, que acontece em Aracaju, Sergipe, entre os dias 06 e 09 deste mês, o Seminário sobre Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), colocou em pauta essa questão a partir da pesquisa do Instituto Semiárido (Insa) em parceria com a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA).

A proposta da pesquisa é analisar o impacto da ação da ASA nos territórios, avaliando sua contribuição para a autonomia e o poder de resiliência econômica e social das famílias inseridas nas dinâmicas da Articulação. Em Sergipe, o Centro Dom José Brandão de Castro (CDJBC ) é a organização que participa da pesquisa e apresentou uma experiência já feita a caracterização para gerar análise e debate durante o seminário. Iva Melo, bolsista que realizou a pesquisa junto com as famílias do território de Sergipe, trouxe a experiência da família de Cida Silva e Seu Claudionor para animar o debate na plenária cujo público foi de técnicos e técnicas das organizações presentes ao Encontro. A família vive no sítio Verde, que fica no município de Porto da Folha, no Alto Sertão sergipano.

A linha do tempo é um dos instrumentos utilizados na pesquisa para construir junto com a família sua trajetória de vida e de construção dos processos de luta e melhorias do seu agroecossistema a partir do acesso a água e outras políticas públicas. “A gente precisa enfrentar o debate de que a lógica da economia na agricultura familiar é diferente. Não é apenas uma matemática. Ela tem outros aspectos que a economia convencional não considera, como a alimentação, o trabalho das mulheres, a troca com a natureza”, chama a atenção o assessor Paulo Pertensen.

A Experiência - Esses elementos dos quais fala Paulo são considerados na pesquisa do Insa/ASA, onde se mostrou a trajetória de Dona Cida e Seu Claudinor, que tem como marco inicial o casamento deles em 1982. Na época, o casal não tinha terra e Seu Claudionor trabalhava de aluguel. O casal viveu a grande seca de 1999, sempre com muita dificuldade. A partir de 2003, Dona Cida começa a vivenciar processos coletivos de organização atuando na Pastoral da Criança, onde aprofundou conhecimentos no trato da terra e na produção orgânica.

Ter acesso à própria terra só aconteceu em 2009, quando o casal adquiriu uma tarefa de terra. Já conhecedora de alguns processos, Dona Cida planejou a construção da casa e da plantação dentro de formatos que potencializassem cada coisa. Para arborizar a propriedade usou frutíferas para produzir alimentos também para a família. A cisterna Calçadão veio em 2010 junto com o Ecofogão. O agroecossistema da família, hoje, tem diversidade e produtividade: quintal produtivo com hortaliças, aves e frutíferas. Na pecuária cria ovinos, planta palma e leguminosas. Tem minhocário, mantém o trabalho coletivo na produção apícola e adquiriu mais terra onde organiza uma área agropastoril. A venda dos seus produtos na própria comunidade é outra estratégia desenhada pela família.

A pesquisa mostra que essa família, que no início tinha a terra como produto, a partir do associativismo, descobriu outra forma de pensar a terra. Descobriu também a ação da ASA e as inovações tecnológicas que potencializam a propriedade e traz qualidade de vida social, econômica e alimentar.  O resultado da pesquisa mostra a apropriação da família, tanto em relação aos instrumentos utilizados para caracterização da propriedade, como a sua metodologia de utilização. Também empodera a família quanto aos resultados econômicos. As planilhas mostram que a renda agrícola, que é o valor monetário final que fica para a família, é significativo.

Para o coordenador do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), da ASA Brasil, Antônio Barbosa, a pesquisa levanta muitas pistas para a atuação junto às famílias agricultoras. “Traz pistas para um monte de coisas: nas políticas públicas, nas estratégias de convivência com a seca. É um instrumento que olha essas coisas, compara e, precisamos ver como se apropriar desse instrumento para utilizar em todos os territórios, nos desafiando a olhar mais de perto para todas essas coisas”, diz Barbosa. O técnico Tiago Jacen, do Maranhão, chamou a atenção para que essa pesquisa seja divulgada não só para a Academia para mostrar cientificamente que outra economia, além da convencional, é possível e as famílias agricultoras estão protagonizando isso nos seus agroecossistemas. “É preciso dar visibilidade a essa pesquisa, para podermos usar esse instrumento em outros lugares, porque ela otimiza as experiências agreocológicas”, explica ele.

“A pesquisa contribui para o debate do território e é uma oportunidade de formação para a equipe e de diálogo com agricultores e agricultoras. Esse instrumento e esse método precisam ser disponibilizados. A gente aprende muito com essas sistematizações, esses conceitos, esses métodos. Eles desenvolvem nossa capacidade de ir criando, construindo outras formas de estudo. Isso é muito rico para nós e nossas organizações”, afirma Cristina Nascimento, do Cetra, Ceará.

A pesquisa – dez organização que fazem parte da Articulação Semiárido (ASA Brasil) realizaram a pesquisa. São dez territórios e cada território fez a caracterização de cinco famílias. A pesquisa começou a ser aplicada em 2014 e as caracterizações das famílias já foram concluídas. A etapa agora é de devolução dos resultados, para os territórios. A sistematização de todas elas com os resultados e suas análises serão transformadas em uma publicação que se pretende lançar ainda este ano, em um Seminário de Conclusão.