Mudanças climáticas
21.08.2020
Projeto Daki-Semiárido Vivo é "uma iniciativa única, inovadora e com grande potencial para gerar mudanças permanentes"
Participantes do webinário destacam elementos essenciais para que esta ação transforme, de fato, as vidas das famílias campesinas das áreas secas da América Latina

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Da esquerda pra direita: Gabriel Seghezzo, Antônio Barbosa, Zulema Burneo (acima), Claus Reiner e Alexandre Pires

Na terça-feira passada (18) à tarde, vários países da América Latina - principalmente os que têm em seus territórios áreas secas, focos de processos crescentes de desertificação e localidades mais afetadas pelo aumento da temperatura do planeta e pela ocorrência de eventos extremos no clima - estavam conectados no lançamento pela internet line de um projeto emblemático para o momento em que o planeta passa: o Daki - Semiárido Vivo. O evento foi transmitido pelas redes sociais das organizações envolvidas.

Nas palavras de Alexandre Pires, da coordenação nacional da Articulação Semiárido (ASA): "Esta tarde damos outro passo importante na articulação e intercâmbio de conhecimentos que envolvem dinâmicas sociais, culturais, econômicas e políticas nas regiões semiáridas de toda la América Latina."

E mais à frente, ele expressa um desejo para esta ação, fruto de uma articulação entre duas redes de organizações da sociedade civil, a ASA e a Plataforma Semiáridos: "Espero que este projeto possa aproximar ainda mais a aliança da Plataforma Semiáridos de América Latina e a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) com os governos locais e nacionais, com o FIDA [Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrário] e outras agências multilaterais, em defesa de um enfoque político que tenha em seu centro a proposta da convivência com o Semiárido".

O conceito da 'convivência com o Semiárido' é algo muito caro para a ASA, que foi um sujeito político que deu grande impulso para a sua concepção a partir de ações práticas. Foi com esta construção ideológica que a ASA e outros sujeitos fizeram o enfrentamento de outro conceito que só gerava fome e pobreza no Semiárido brasileiro, o 'combate à seca'. Este termo servia de lastro para alimentar a 'Indústria da Seca", que sob a justificativa de desenvolver ações emergenciais para socorrer as vítimas da seca, extraiam dos cofres públicos recursos para financiar obras hídricas em propriedades privadas de pessoas relacionadas com o poder político e econômico em diversas instâncias federativas.

No lançamento do projeto, que diminui as distâncias entre as áreas secas da América Latina, outro conceito foi trazido com força: Semiáridos. No plural. Segundo Gabriel Seghezzo, da Plataforma Semiáridos e da Fundação para o Desenvolvimento da Justiça e Paz, com atuação na região do Grande Chaco (Argentina, Bolívia e Paraguai), Semiáridos é "um conceito político, climático, social, econômico e cultural."
 
Segundo Gabriel, Semiáridos expressa um nome emblemático porque não evidencia apenas regiões com semelhanças climáticas e de paisagens. "Há também outras semelhanças mais profundas: diversidade cultural, que nos orgulha; diversidade biológica que dá a região um potencial de desenvolvimento; o histórico de trabalho social e organizativo que gera uma massa crítica institucional impressionante; milhares de organizações indígenas e campesinas com suas lutas semelhantes, diagnósticos e soluções que podem debater e pensar em direção ao futuro, para juntos, vencer a exclusão e a marginalização, que também são características comuns em nossas regiões", declarou Gabriel.

Segundo dados citados na fala de Alexandre, cuja fonte é a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), uma fundação ligada ao Ministério da Saúde do Brasil, das 800 milhões de pessoas em situação de fome no mundo, metade são agricultores e agricultoras que vivem em regiões semiáridas, cuja realidade se agrava ainda mais com o fenômeno da crise climática que torna ainda mais crítica a dificuldade no acesso à água de qualidade, bem como à segurança alimentar e a outros direitos humanos básicos.

Nas falas que celebravam e anunciam o início de uma ação de grande porte na América Latina, a de Antônio Barbosa, que coordena o Projeto Daki-Semiárido Vivo e dois programas da ASA de estoque de água para a produção de alimentos e de sementes crioulas, carregou as tintas no destaque de algo que é um dos principais princípios da ação: o reconhecimento e valorização do conhecimento dos povos do Semiárido. Mas o projeto não só propõe reconhecer e valorizar. Sua proposta é construir metodologias para que este conhecimento popular sistematizado ganhe força para impulsionar a criação de políticas públicas de diferentes âmbitos governamentais.

"Queremos destacar a importância do conhecimento tradicional, que respeitado e em diálogo com o conhecimento acadêmico podem enfrentar as mudanças climáticas e seus impactos na vida e nos territórios semiáridos da América Latina", profetizou Antônio. E sintetizou: '[O projeto é] uma iniciativa única, inovadora e com grande potencial para gerar mudanças permanentes".

Na sua fala, Claus Reiner, gerente de programas do FIDA para o Brasil, ressalta uma percepção do Fundo das Nações Unidas de que não há muitas capacidades para apoiar o processo de transformação rural que se dá devido às mudanças no clima. "São diversos sistemas que [as famílias rurais] necessitam para sobreviver nestas condições. Estas práticas agrícolas resilientes ao clima são muito importantes e é o que o projeto vai fazer: Identificar, analisar e documentar, através de diferentes formas, as práticas agrícolas resilientes ao clima."

A moderadora do evento, Zulema Burneo, coordenadora da Coalizão Internacional pela Terra (ILC) para América Latina e Caribe, salienta que projetos como o Daki-Semiárido Vivo são parte de um processo maoir e complexo capaz de gerar um capital social e humano a partir de relações sustentáveis entre organizações sociais e agricultores, indígenas, campesinos e quilombolas, que cria uma atmosfera de confiança e respeito, e também a partir das relações entre as instituições que executarão o projeto Daki-Semiárido Vivo.

Para conferir o evento, clique aqui ou aqui