Seminário
10.05.2023
Sociedade civil e governo querem urgência na retomada de políticas públicas que protejam a sociobiodiversidade da Caatinga
Na semana da Caatinga, evento lembrou da importância de cuidar do bioma o ano todo

Voltar


Por Kleber Nunes | ASACom

Bioma foi tema do seminário “Políticas de Convivência com o Semiárido, Meio Ambiente e Saúde”, realizado no dia 27 de abril, em Brasília | Foto: Zeca Miranda

Bioma genuinamente brasileiro, a Caatinga está no centro das soluções para a convivência com o Semiárido, o que implica no maior acesso à água de qualidade, produção de alimentos saudáveis e geração de energias verdadeiramente limpas. O seminário “Políticas de Convivência com o Semiárido, Meio Ambiente e Saúde”, realizado no dia 27 de abril, em Brasília, apontou que é essa a direção para a retomada de políticas públicas que visem o desenvolvimento do interior do Nordeste e de Minas Gerais.

O evento promovido pela Articulação Semiárido Brasil (ASA) junto com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), anfitriã do seminário, reuniu representantes da sociedade civil, pesquisadores e integrantes do Governo Federal. A iniciativa fez parte do projeto Terras de Vidas II, protagonizado pelo Centro Sabiá e o Caatinga, com apoio da Cáritas Alemã. 

Os convidados para a mesa de abertura, a partir das suas atribuições e considerando as mais diversas realidades e desafios presentes na Caatinga, sinalizaram para o fortalecimento do bioma e de todos os que habitam nele. “Esse encontro é um fortalecimento, uma retomada da estratégia de convivência com o Semiárido, a partir das políticas públicas, para que a gente possa ter territórios saudáveis, agroecológicos e pulsantes”, afirmou a integrante da coordenação executiva da ASA e presidente da mesa de abertura, Andréa Lima.

Conviver com a Caatinga e não combatê-la

A primeira contribuição para o debate partiu de quem vive cotidianamente no Semiárido e ajuda a mantê-lo vivo. Dona Nenzinha, como é conhecida a agricultora e guardiã de sementes crioulas Maria Madalena Oliveira Leite, de Minas Gerais, comemorou a oportunidade de estar no evento depois de “seis anos distante dos movimentos que fortalecem o agricultor”.

“Eu produzo pouco, mas tenho o prazer de toda segunda-feira encher duas sacolas e sair de ônibus e entregar no restaurante da Cooperativa Grande Sertão um alimento saudável que eu produzo. Nós somos povo simples, mas é um povo que ama o que faz e temos que defender uma alimentação saudável e o meio ambiente que é o principal”, disse.

Aproveitando o depoimento de dona Nenzinha, que ilustrou a urgência da conservação e do aproveitamento racional do bioma, o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Hermano Castro, destacou a necessidade do fortalecimento e da implementação do Programa Nacional de Saneamento Rural.

O representante da autarquia declarou que tem interesse em desenvolver, dentro do Programa Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Fiocruz, um trabalho com a ASA para a implantação de sistemas de tratamento das águas cinzas e fecais no Semiárido. “Quero firmar aqui esse compromisso, e faço um convite para a ASA comparecer ao nosso conselho deliberativo para dar um informe qualificado do que representa essa política e qual é a nossa possibilidade de cooperação”, declarou Castro.

No âmbito do Ministério da Saúde, a Caatinga tem sido vista, sobretudo, pelas lentes da Assessoria para os Territórios. Segundo o assessor especial da pasta, Valcler Rangel é na floresta semiárida que se encontram as bases para a reconstrução do país e esse alicerce está na agroecologia, no enfrentamento à crise ambiental e na resistência dos quilombolas, populações ribeirinhas, indígenas e de outros grupos nativos.

“Essa ideia vem no sentido de olhar para as potências do territórios. População do campo e população da cidade unidas em torno desses grandes objetivos, enfrentar a fome e a pobreza que é imposta por um modelo de desenvolvimento que é excludente”, explicou Rangel.

O diretor nacional do Fundo Internacional do Desenvolvimento Agrícola (Fida), Calus Reiner, acrescentou que quaisquer que sejam as ações de políticas públicas para a Caatinga, as pessoas devem estar no centro, pois são elas, especialmente, “no âmbito rural as mais importantes”. A partir daí, defende ele, enfrentar os desafios que não dizem respeito apenas à água, mas também à degradação do solo, redução da biodiversidade, problemas de inclusão e falta de acesso aos serviços públicos.

Programa Cisternas e desmatamento zero

Seguindo nesse debate de enfrentamento das dificuldades e da promoção da cidadania na Caatinga, a secretária Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Lilian Rahal, lembrou o início do Programa Cisterna. A política de convivência  com o Semiárido desenvolvida pela ASA e pelo Governo Federal está completando 20 anos e será retomada observando os novos desafios da região.

“O programa ressurge como um instrumento não só de segurança alimentar e nutricional, mas com reconhecimento de ser um importante instrumento de segurança hídrica, de resiliência e adaptação às mudanças climáticas e combate à desertificação. Nosso compromisso agora é retomar, olhando para o que a gente tem de novo”, avaliou.

O que há de novo duas décadas depois da construção da primeira cisterna, fruto da parceria entre a ASA e o governo, é de que não se luta contra as ameaças das mudanças climáticas, mas sim contra o impacto que já chegou. Essa foi a observação da Secretária Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável, Edel Moraes.

“Esse bioma que é especialmente brasileiro que serviu e tem servido para debates mundiais como a COP da desertificação. E creio que o Brasil tem muito a ensinar para o mundo através da Caatinga, da experiência do que é resiliência, do que é adaptação e do que é convivência com o Semiárido”, afirmou a representante do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.

A pasta, ainda de acordo com Edel, está assumindo o compromisso do desmatamento zero em todos os biomas, inclusive a Caatinga, com planos específicos para cada região. “Essa é a nossa política porque entendemos que fazer isso é trazermos e darmos visibilidade a todos os povos e comunidades tradicionais. Nós precisamos dizer que na Caatinga tem povos e comunidades tradicionais, tem gente vivendo e convivendo com o Semiarido”, reforçou.